Quem é vulnerável na relação tributária dos dias atuais, o contribuinte ou a Fazenda Pública?
Com este questionamento convido todos a fazerem uma reflexão.
Com frequência meus clientes me questionam sobre a voracidade do Fisco Estadual, a disparidade de meios que existe a disposição do contribuinte para se defender de cobranças e as ferramentas que o Estado tem para cobrar o contribuinte, que muitas vezes se vale de meios coercitivos para cobrar o contribuinte, e ocasiona uma série de transtornos que inviabiliza o desenvolvimento regular de suas atividades comerciais.
Isso ocorre porque o Fisco geralmente se vale da premissa de que “todos são sonegadores”. Contudo, nem todos que apresentam pendências junto ao Fisco Estadual podem ser rotulados como “sonegadores ou devedores contumaz”, como geralmente é divulgado em notícias.
Não resta dúvida de que a sonegação fiscal é uma conduta cuja gravidade embasa sua tipificação como crime no ordenamento jurídico brasileiro pelo art. 1.º da Lei n.º 8.137/1990, e, por conseguinte, tem significativo impacto na arrecadação pública.
Ocorre que, muitos casos com os quais nos deparamos é possível constatar que a cobrança do Fisco Estadual é indevida. A título de exemplo destaco casos em que o mesmo débito é objeto de três execuções fiscais distintas, ou seja, o Estado ajuíza três processos com base no mesmo débito, mesma certidão de dívida ativa (CDA).
E neste contexto na prática ocorre o seguinte:
Quando o contribuinte réu em execução fiscal é citado, uma das garantias que lhe é apresentada é a nomeação de bens dentro dos 5 dias que sucedem à citação, logo, NÃO PAIRA DÚVIDA DE QUE DETÉM A PRERROGATIVA DE ESCOLHA DA GARANTIA A SER APRESENTADA.
A legislação processual prevê, além da ordem de preferência de bens para penhora, que, quando houver outros meios para promover a execução, esta deve se dar de forma menos onerosa para o executado. Há, portanto, que se buscar o equilíbrio entre a satisfação dos interesses do credor/Fisco Estadual e as possibilidades do devedor/contribuinte. Trata-se de um caso típico de execução que pode ser conduzida de forma menos onerosa sem prejuízo à sua efetividade.
Ocorre que durante o processo, mesmo o contribuinte apresentando uma garantia para se defender, o Estado ao se deparar com garantia que não seja dinheiro, sob o argumento de que deve ser respeitada a ordem de bens prevista na Lei de Execução Fiscal (Lei 6.830) que prevê primeiramente dinheiro, imediatamente pede a realização do Bacenjud, que é a busca de dinheiro do executado/contribuinte em suas contas bancárias, tanto da empresa, como também de seus sócios que geralmente são incluídos como responsáveis solidários na execução, e neste contexto o pedido na maioria das vezes é deferido pelo Juiz e o contribuinte se surpreende com o dinheiro bloqueado na conta bancária.
Logo, este contribuinte que em alguns casos está respondendo por uma cobrança indevida, tem o dinheiro bloqueado, o que compromete o caixa da empresa, além da inclusão do débito em dívida ativa, cadastro de restrições (CADIN), protesto, situações que abalam sua credibilidade junto a fornecedores e instituições bancárias, o que inviabiliza o negócio do empresário, que tem custos elevadíssimos para manter uma empresa, dos quais se destaca a folha de pagamento de funcionários. Assim mesmo agindo de boa-fé honrando com seus compromissos junto ao Fisco, em muitas situações é surpreendido com cobranças ARBITRÁRIAS TOTALMENTE INDEVIDAS.
É evidente que vem prevalecendo o direito arrecadatório do Fisco e não há Justiça Tributária. Não paira dúvida de que nas relações tributárias em Mato Grosso o paradigma da igualdade não apenas é desprezado como invertido.
O Fisco parte da premissa que todos são sonegadores e o Judiciário ao invés de tentar compreender o impacto de cada uma destas ações restritivas buscadas pelo Fisco Estadual, que inviabilizam e dificulta o desenvolvimento das atividades do empresário, e neste ponto importante destacar que o pequeno empresário que sempre é o mais prejudicado, acaba corroborando com a premissa do Fisco Estadual de que todos são sonegadores e que deve ser garantido o direito do Estado.
Quando se fala em direito tributário, execução fiscal, direito do Estado e do contribuinte, a pauta exige dos operadores do direito domínio e monitoramento das discussões, sem trazer mais prejuízos para o empresário, garantindo o seu direito de defesa de forma menos onerosa, e não impondo uma prévia condenação, esta relação deve ser equilibrada, e não da forma que vem ocorrendo.
Não se pode admitir que a finalidade arrecadatória prevaleça sobre a justiça tributária. E assim como explicamos para os clientes, não devemos nos conformar com interpretações jurisprudenciais que não examinam criticamente a falsa posição de fragilidade fazendária, que tendem a conduzir as relações fiscais, muitas vezes de forma inconsciente, para o arriscado campo do totalitarismo fiscal, no qual os fins justificam os meios.
Precisamos de uma atuação colaborativa do judiciário, no sentindo de atuar de forma imparcial, despidos da ideia de que todos são sonegadores, e neste contexto o profissional ao defender o contribuinte deve estar munido de estudos, materiais e demonstrações técnicas do direito em discussão, pois estes são os formadores das teses a serem submetidas à apreciação do Judiciário.
*Daniele Fukui Rebouças é especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Direito Tributário (Ibet), conselheira no Conselho de Contribuintes da Sefaz - MT, conselheira estadual da OAB-MT e membro da Comissão de Estudos Tributários e Defesa do Contribuinte da OAB-MT.